Sobre os chamados “custos de transação”

No dia 05 nov 2021, M. F. de Castro participou como palestrante de um seminário virtual sobre instituições de Direito, no Programa de Pós-graduação em Direito da UFRJ.

Em nota posterior, compartilhada no dia 07 nov 2021, o palestrante ofereceu um comentário suplementar à resposta dada a uma questão sobre “custos de transação”. A seu ver, alguns esclarecimentos adicionais seriam úteis para os participantes da atividade. Tendo em vista que os comentários suplementares podem ser de interesse dos membros do GDES, estão reproduzidos abaixo.

“[R]efiro-me ao que escrevi em meu livro (Castro, 2012) (…) (p. 206-209). Como penso ter deixado claro nesse texto, e ainda enfatizando alguns aspectos do que está dito ali, é possível tomar os ‘custos de transação’ (CTs), na abordagem de Coase e no uso que subsequentemente dela se fez, como autênticos ‘malefícios’ decorrentes de algum investimento, uma ideia parecida com a noção de ‘externalidades negativas’, da Economia do Bem-estar. O exemplo, discutido por Coase em resposta a Pigou, sobre o trem que incendeia florestas é cristalino. Ora, é possível perceber que, na discussão de Coase, os malefícios decorrentes de investimentos lucrativos devem ser tratados como meros custos operacionais dos mesmos investimentos, devendo por isso [segundo o argumento de Coase] receber o beneplácito de juristas que se defrontem com situações litigiosas emanadas da situação prática gerada a partir de reações das vítimas dos malefícios. Rebatizar os malefícios, dando-lhes o nome de ‘custos de transação’, opera uma brutal transformação semântica, que a meu ver deve ser criticada. A AED (estilo Chicago) tipicamente emprega a Análise de Custo-Benefício (ACB), adotado o pressuposto de que tal cálculo poderá indicar se, em decorrência de regras (jurídicas) de organização institucional da economia, ocorre, ou não, uma diminuição dos custos de transação. Quanto maior a proporção em que os CTs sejam ‘diminuídos’, em uma situação concreta, tanto mais pesado será o ônus econômico imposto à(s) vítima(s) dos malefícios causados pelo investimento (p. ex., poluição, mudança climática, aumentos na onerosidade da assistência médica, para os adquirentes dos planos de saúde, e inúmeras outras formas de precarização dos direitos fundamentais). A decisão judicial que adote a AED tenderá, portanto, a ser um meio de impor graves ônus às vítimas de malefícios gerados por investimentos que sejam lucrativos para os investidores. A chamada ‘Análise de Impacto Regulatório’ (AIR) — incorporada à Executive Order 12291 do presidente Ronald Reagan em 1981 e em seguida promovida globalmente pela OECD, além de replicada no Brasil via Decreto 10411/2020 e a lei que menciona — constitui um desdobramento da visão expressa na teoria dos CTs tal como articulada pela AED.”

À luz do que vai acima, parece claro que juristas não devem deixar-se levar pela insistência de certas autoridades econômicas em aplicar acriticamente o cálculo de custo-benefício em inúmeras situações.

One Response to Sobre os chamados “custos de transação”

  1. […] o conceito de “custos de transação” com a chamada “análise de custo-benefício” (ver aqui), tendem a favorecer os interesses de grupos de investidores (em especial, grandes empresas) em […]

    Like

Leave a comment